CAPÍTULO
3
PINCELADAS EM ASSUNTOS QUE DEVEM SER
CONSIDERADOS
Você vai iniciar uma jornada chamada SEU NEGÓCIO rumo ao desconhecido e
precisará enfrentar um oceano repleto de armadilhas, mas que é também salpicado
de ilhas com socorro e suporte de qualquer espécie. Na partida você tem à
disposição apenas um pequeno barco a remos (SEU CAPITAL), sua força física (SEU CONHECIMENTO GERAL) e pode levar alguma coisa para a
sobrevivência inicial (SEU PREPARO
ESPECÍFICO) até a primeira ilha onde, quando alcançá-la, poderá trocar por
um pequeno veleiro oceânico, arranjar um marujo ajudante, levar mais
suprimentos, etc. Na medida em que vai adentrando nesse imenso mar, vai
conquistando milhagem (SEUS CLIENTES),
melhorando de barcos (O TAMANHO DE SEU
NEGÓCIO) e de tripulação (SEUS
EMPREGADOS) até chegar num enorme navio transatlântico, repleto de recursos
humanos e técnicos, que seria uma empresa de grande porte no nosso mundo
aquático.
A analogia levanta a pertinente questão
do que é essencial levar no momento da partida, visto que o primeiro barco é
frágil e quase nada cabe nele.
Existem
milhares de livros, revistas e artigos que ensinam o que fazer para ter sucesso
na vida empresarial, na vida profissional, na vida pessoal. Poucos existem
sobre o que não deve ser feito para evitar atrapalhos. Não há dúvida que por
trás de cada acerto relatado existem diversas, talvez dezenas, de tentativas,
ou se preferir, erros e sobre isso quase ninguém escreve. Pode parecer
paradoxal, mas essa informação, o detalhe do que não fazer em determinada
situação, faz diferença, pois o que parece ser certo fazer num momento crítico
da empresa pode, em muitas das vezes, vir a agravar o problema. Em meu caso
pessoal, por exemplo, embora contasse com bom conhecimento nas áreas
administrativa e financeira, tinha nenhuma experiência no comércio varejista e
paguei um alto preço por não saber o que não fazer (veja o capítulo 5).
Assim
sendo, não deixe de levar em seu barco água, comida, bússola, colete
salva-vidas e protetor solar, contemplando os cinco itens que considero
imprescindíveis para a sobrevivência inicial de um negócio próprio, de maneira
que passo a comentá-los.
A
água: Cuide dos números de sua empresa.
Sem ela ninguém sobrevive. Por ser tão
importante, dediquei um capítulo exclusivo sobre ela, que é representada pelos
números de sua empresa. Não é possível deixar de lado o uso contínuo e regular
dos conceitos práticos apresentados no capítulo 4 deste livro, essenciais não
só para o início, como também para a jornada da empresa, independente da época
de sua vida.
A
comida: Esforce-se na escolha de um bom ponto
comercial.
Quem sustenta uma empresa são os
clientes e o ponto comercial deve ser escolhido como se fosse 99% da razão do
sucesso de seu empreendimento.
O
comércio, em seus primórdios, era feito em feiras nos povoados e o escambo, ou
troca de mercadorias, era usual. Com a invenção da moeda apareceram as lojas e,
posteriormente, os grandes comércios, como os mercados do império romano. O
Mercado de Trajano, o primeiro shopping da história, tinha cento e cinquenta
estabelecimentos e foi inaugurado no ano 108 DC. Possuía cinco andares assim
distribuídos: no térreo vendiam-se jóias, flores, frutas, facas e armas; no
primeiro andar vinho e óleo; no segundo e terceiro especiarias, temperos e
tecidos; no quarto encontravam-se os escritórios públicos e no último andar,
frutos do mar, conservados em viveiros.
Posteriormente,
no início da era industrial, também não havia problemas para escolher um ponto
de venda, pois o comércio acompanhava os trilhos dos bondes e se aglomerava na
praça principal das vilas e cidades. As maiores e melhores lojas localizavam-se
na área central das grandes cidades. Da segunda metade do século passado em
diante, o crescimento urbano, a massificação do transporte individual, o
acirramento da concorrência, a facilidade da informação e por fim a reinvenção
dos centros de compra fez com que aquelas simples regras fossem quebradas.
Hoje,
a escolha de um ponto comercial requer diversos estudos como levantamento de
dados estatísticos da população da região, fluxo de pedestres e/ou veículos,
poder e hábitos de compra da comunidade, concorrência direta e indireta, etc.
Mais recentemente surgiu o geoprocessamento, que vem a ser o mapeamento digital
de uma cidade, ou bairro, que associado a dados armazenados no computador, pode
definir o ponto ideal. Há ainda que se escolher entre instalar a loja numa rua
de comércio variado, numa zona de comércio especializado (chamado cluster) ou num shopping.
Adotando
as regras e cuidados consagrados na busca do endereço certo, evite a
subjetividade, algo como aquele sentimento de que o local vai ser bom ou ruim.
Você pode tentar maximizar as possibilidades de acerto se contar com uma
assessoria ou consultoria especializada no assunto. Ainda assim, o ponto escolhido
pode não ser tão bom quanto previsto, como pode também ser melhor que o
esperado, pois há uma certa dose de sorte envolvida neste processo, onde quase
nunca 2 + 2 dá 4, ou seja, o grau de acerto ser igual a 100%. Se o resultado
for 2, ponha as barbas de molho. Se der mais que 5, solte foguetes. Se ficar
entre 3 e 5, comemore o acerto com um bom e agradável espumante nacional.
Para
seu conhecimento, apresento a seguir alguns dos principais cuidados, que de
maneira geral, são considerados na procura de um local que seja facilitador de
vendas:
→ Em qualquer tipo de
localização da loja, verifique se o valor das luvas é compatível com sua
capacidade de investimento. Procure conseguir um contrato de no mínimo cinco
anos, observe se as modificações necessárias no imóvel para sua atividade estão
dentro do razoável, analise se o aluguel e taxas não elevam muito o ponto de
equilíbrio e se o movimento esperado vai propiciar retorno do capital investido
corrigido, antes do término do prazo da locação;
→ Os melhores pontos
já estão ocupados. Se for possível faça uma oferta para o dono de um que
identifique como bom para seu negócio;
→ Se for em shopping,
devem ser evitados pontos em finais de corredores ou com frentes voltadas para
parede cega. Estar próximo de escadas rolantes ou no caminho natural das
pessoas é muito melhor. Se a loja for de alimentação, o ideal é que fique na
praça destinada a este fim. O perfil do público frequentador, o mix das lojas,
os custos e exigências impostas pela administração também devem ser
considerados;
→ Se for na rua,
analise a visibilidade, os eventuais obstáculos físicos (escadas, postes,
árvores). Prefira esquina a meio de quadra. Observe o movimento do local em
prospecção durante vários dias e em horas alternadas. Converse com os donos de
lojas vizinhas sobre potenciais problemas (segurança e assaltos na região).
Verifique também se o público alvo é igual ao seu. A fachada é o primeiro fator
de influência na seleção do público alvo. Lojas de rua são mais visitadas se
estiverem na mão de retorno para a residência das pessoas. Possuir
estacionamento ou ser fácil estacionar nas proximidades é vital. Grandes
avenidas com retornos e estacionamentos proibidos afastam o comprador. Grande
movimento de pedestres sugerem lojas com produtos de compra por impulso. Ruas
mais calmas adaptam-se melhor à venda de produtos diferenciados e mais caros;
→ Loja em ruas ou
zonas de comércio especializado (cluster)
são específicas e os clientes normalmente não são fiéis, pois procuram apenas
por preços e oportunidades que lhes são oferecidas, independentes do
estabelecimento. Em tese, as margens que podem ser praticadas são menores e
compensadas por um giro maior.
A
bússola: Faça um Plano de Negócios tão completo
quanto puder.
A orientação de uma empresa deve ser
dada pelo Plano de Negócios, que é um planejamento detalhado contendo valores
monetários e os itens da proposta de seu empreendimento. O Plano de Negócios
examina e se constitui de fonte de informação das oportunidades e riscos de
mercado, das etapas para a consolidação do negócio, passando pelas simulações
financeiras e cálculo do ponto de equilíbrio. Possíveis investidores, ou sócios
capitalistas, não abrem mão da análise detalhada do Plano de Negócios de sua
empresa.
O Plano de Negócios deve ser elaborado
por você e deve agregar dados objetivos. Balize-se pela literatura disponível
sobre o assunto e conte com informações obtidas em campo. Se possível, contrate
assessoria de pessoas ou empresas experientes para a elaboração de cenários do
mercado. Neste caso, seja crítico com o trabalho recebido.
COMENTÁRIO:
penso que os propósitos da Lei do Franchising N˚ 8.955 seriam mais eficazes se
incluíssem um artigo exigindo a construção conjunta, envolvendo Franqueado e
Franqueador (nesta ordem), de um Plano de Negócios específico para a futura
Unidade Franqueada.
Veja abaixo o esqueleto de um Plano de
Negócios, grafado como business plan
por alguns autores:
Resumo
executivo
Resumo dos principais aspectos do
plano, incluindo sua finalidade.
Apresentação
da empresa
Tipo de empresa e enquadramento junto
ao fisco. Perfil dos empreendedores, razões da existência (histórico), alianças
e parcerias, recursos humanos necessários, principais produtos.
Missão
e valores
A missão mostra o que vai ser
oferecido aos clientes e porque a empresa dispõe tal produto ou serviço ao
mercado. Os valores (com sentidos filosóficos) significam a maneira de fazer as
coisas e como a empresa vai ser conhecida no mercado (excelência no
atendimento, produtos confiáveis, qualidade superior, etc).
Foco
do negócio
Descrição o negócio em si, o produto
ou serviço e o público alvo (segmentos, nichos, classes sociais, classes
profissionais).
Análise
do macro-ambiente
São as oportunidades e ameaças da
economia, avanços tecnológicos, crescimento demográfico, política governamental
e mudanças socioculturais.
Análise
da empresa
Poder de permanência, agilidade e
flexibilidade, pesquisa e desenvolvimento, capacidade de reação em relação aos
concorrentes. Descrever os pontos fortes e os pontos fracos da empresa nestes
cenários.
Análise
completa do mercado
Quem são, o que compram, por que, onde
e quando compram os consumidores. Identificar concorrentes diretos, indiretos e
fornecedores.
Posicionamento
Trato do produto ou serviço por
intermédio de uma matriz conhecida como BCG (da consultoria norte-americana
Boston Consulting Group). Apresenta cada um sob a ótica da taxa de crescimento
de mercado X participação relativa de mercado.
Plano
de marketing
Estratégia de atuação. Alianças e
parcerias. Canais de distribuição. Delinear as ações na esfera dos 4Ps (ponto
comercial, produto, preço e propaganda).
Plano
de investimentos
Descrição. Cronograma físico e
cronograma físico-financeiro. Incluir possíveis fontes de financiamento do
empreendimento.
Simulação
de relatórios financeiros
Previsão de receitas, ponto de
equilíbrio, fluxo de caixa, balancetes e Balanços para o período coberto pelo
plano.
Estratégia
geral
Conjunto de decisões que vão ditar os
rumos da empresa. Pode incluir uma estratégia corporativa e outra voltada para
o marketing, detalhando quem executará cada tarefa (definição e apresentação da
equipe).
Objetivos
Aqui é o momento para esmiuçar números
como volume de vendas, participação no mercado, simulações com vendas
pessimistas, esperadas e otimistas.
Monitoramento
O plano deve apontar quem será ou quem
serão os responsáveis, em cada área, pelo monitoramento dos processos. Auxilia,
no caso, a previsão de medidores em processos-chave. Esses medidores,
geralmente quantificáveis, não deixam que eventuais falhas sigam adiante e
comprometam o plano.
Anexos
Podem trazer pesquisas, auditorias,
dados adicionais, informações da mídia que sustentem pontos do plano.
O
colete salva-vidas: Coloque-se no lugar do cliente,
sempre.
Da
mesma forma que você pode encontrar vários tipos e modelos de coletes
salva-vidas, existem dezenas de regras e dicas de como atender corretamente o
consumidor. Ao longo dos anos inúmeras pessoas tem estudado o assunto e ao que
parece não faltam idéias e publicações sobre o atendimento ao cliente. Então, o
que mais falta falar sobre a gestão de serviços? Tamanha variedade oportuniza a
opção pelo colete que apresente a melhor relação custo-benefício, ou seja, que
selecione as regras realmente eficazes e que dão resultados. Tal e qual um
colete salva-vidas, estas regras devem permanecer operacionais e em condições
de uso ao longo de toda jornada da empresa, para uma segura e tranquila
travessia no desconhecido mar das percepções dos clientes.
O
sucesso de uma empresa nos dias atuais está comprometido diretamente com a
qualidade do atendimento que ela presta. O produto e os serviços oferecidos não
são mais questões separadas. Já não basta ter o melhor produto se o atendimento
não for bom. Juntos e no mesmo nível de qualidade formam a principal vantagem
competitiva de uma empresa moderna. O importante é manter os clientes
satisfeitos e fazer tudo para torná-los usuários frequentes do produto ou
serviço da empresa.
As pessoas sempre buscam nas disputas
de qualquer ordem o artifício de antecipar os movimentos e as estratégias do
outro lado para obter vantagens competitivas. Por que, então, este ensinamento
de se colocar no lugar do outro quase nunca é usado quando se trata de
conquistar clientes? Por exemplo, alguém perguntou, a nós consumidores, se
gostamos de ser atendidos por uma máquina falante robotizada que diz aperte tal
número para isso, tal para aquilo quando ligamos para consultar ou reclamar de
algo? Não! Nos enfiaram goela abaixo uma tecnologia que só faz irritar aos
clientes e que tira milhares de postos de trabalho do mercado.
Em
outras palavras, o que realmente importa é como o cliente vê o serviço prestado
e não como as empresas imaginam que é prestado. Parece simples e muitas
campanhas de marketing até enfatizam “nós pensamos em você” ou “você é a pessoa
mais importante”. Na verdade, há muita hipocrisia em propagandas quando dizem
que o que importa é o cliente. Na hora do vamos ver, o consumidor tem seu
pleito desprezado ou ignorado na maior parte das vezes. Ao que me consta, o
descontentamento é mais regra do que exceção. Atire a primeira pedra quem
sempre foi bem atendido e nunca teve reclamações enquanto consumidor. Isso
acontece porque as empresas adotam a Lei de Gerson e julgam que os clientes, da
mesma forma que elas, também querem levar vantagem em tudo. Talvez essa
concepção seja natural no mundo competitivo em que vivemos, mas o melhor para
todos, sem dúvida, é a busca pelo equilíbrio na troca de valores: o cliente
trocando seu dinheiro por um produto ou serviço, cujo valor é proporcionado
pela percepção causada e a empresa recebendo o pagamento, com valor meramente
monetário, para repor as despesas efetuadas na disposição do produto ou serviço
ao mercado.
Um dos melhores trabalhos que já li sobre
gestão de serviços foi feito pelos professores Richard B. Chase e Sriram Dasu,
da Marshall School of Business, quando afirmam que em qualquer prestação de
serviços, desde a entrega de uma pizza até uma complexa consultoria, o que vale
é a percepção do evento, ou seja, como o cliente vê o serviço prestado. Nesse
enfoque, o desfecho tem importância fundamental pois, um final desagradável
geralmente ocupa a lembrança das pessoas por muito tempo. São cinco princípios
que estão esquematicamente resumidos:
Princípio
1:
proporcione um desfecho marcante pois o final é o que fica na lembrança do
cliente;
Princípio
2:
elimine o mais cedo possível as experiências ruins, ou seja, resolva um
problema rapidamente;
Princípio
3:
para os clientes, as experiências com frequência parecem mais longas quando são
fracionadas. Segmente o prazer, reduza a dor. Em outras palavras, boas notícias
podem ser dadas aos poucos, más notícias devem ser dadas todas juntas. Uma
interessante aplicação deste princípio é, por exemplo, proporcionar pequenos e
sistemáticos mimos aos clientes ao invés de maiores e esporádicos;
Princípio
4:
as pessoas sentem-se mais felizes e mais à vontade quando estão no controle,
mesmo que simbólico, de parte de um determinado processo. Um exemplo comum deste
princípio é quando pedimos carne num restaurante e o garçom pergunta se
gostamos, ao ponto, bem ou mal passada;
Princípio
5:
as pessoas se apegam a rituais e para os consumidores as atividades conhecidas
e repetitivas lhes dão a sensação de conforto e ordem. Um bom exemplo da falta
de atenção para com este princípio, e suas consequências, foi relatada pelo
consultor de administração Michael E. Gerber em seu livro The E-Myth. Diz ele
que experimentou por três vezes um novo cabeleireiro: na primeira vez lavaram
seu cabelo e o cortaram com tesoura enquanto alguém mantinha sua xícara de café
sempre cheia; na segunda visita não lavaram a cabelo e o cortaram com tesoura e
máquina, oferecendo café somente uma vez; na terceira ida ao salão quebraram a
rotina novamente, fazendo tudo diferente. Gerber decidiu que já era demais e
nunca mais voltou àquele local para cortar o cabelo. Ele finaliza dizendo que
não foi o corte, que gostou, nem o cabeleireiro, que era uma pessoa agradável e
conhecedora do ofício. Foi algo muito mais importante, não havia nenhuma
consistência no atendimento aos clientes.
A ciência comportamental prova, em
última análise, que só há uma coisa realmente importante na prestação de
serviços: a percepção do cliente sobre tudo o que se passou. É salutar para seu
negócio, portanto, colocar-se no lugar do consumidor e visualizar todos os
momentos que ele passa com você e seus empregados. As pessoas que projetam e
supervisionam a prestação de serviços precisam dar mais atenção aos fatores que
afetam essa percepção. A luz que a ciência joga sobre esses fatores só será
útil se os executivos usarem de empatia e imaginação, em doses iguais, para
aperfeiçoar os serviços.
O
protetor solar: Aproveite a BOA SORTE.
O protetor solar simboliza o fator
sorte que, tenha certeza, é muito desejável para sua travessia. Sem essa camada
protetora precisará ser infalível na escolha dos momentos de remar porque, do
contrário, o sol lhe provocará queimaduras que atrasarão a jornada.
Existem
pessoas que se destacam de alguma forma e que creditam seu sucesso à sorte. São
pessoas inteligentes e experientes, reconhecendo que foram brindadas com a
sorte de fazer o que gostam e para o qual possuem talento.
Outras
entretanto, sem aquele “toque” da sorte, dão o melhor de si e o resultado quase
nunca é proporcional ao esforço despendido. Procuram explicações lógicas e não
encontram. Depois, para piorar sua frustração, aparecem os profetas do leite
derramado dizendo “eu sabia que não ia dar certo”. Todavia, em outras ocasiões,
sem muito trabalho, o resultado que conseguem é espetacular. O que deu errado?
O que deu certo? O que aconteceu?
Já
há alguns anos venho tentando responder a estas questões e, observando e
compilando histórias de sucesso, acho que achei a resposta. Embora cada uma
delas tenha suas particularidades, todas têm algo em comum: o fator sorte. Por
isso, quero afirmar e demonstrar que o fator sorte existe e não é imponderável.
Não me refiro à GRANDE sorte de ganhar na loteria ou à sorte de ganhar em
sorteios diversos. Quero enfatizar a sorte — ou a falta dela — no dia a dia de
todos nós, que muda radicalmente a vida de pessoas, fazendo muitas das vezes, a
diferença entre o sucesso e o fracasso, entre a glória e o limbo, entre a vida
e a morte.
Só
para ilustrar, permita-me citar de forma resumida alguns casos explícitos e
contemporâneos, famosos ou não:
— Michael Schumacher:
o grande campeão Michael Schumacher estreou as pressas e de forma inesperada no
GP da Bélgica de Fórmula 1 de 1991 porque o francês Bertrand Gachot, piloto da
Jordan, foi impedido de correr por estar preso devido a um processo por
agressão a um motorista de táxi inglês. Isso acabou por se mostrar decisivo no
futuro daquele alemão de 22 anos. Michael demonstra consciência de que o mero
acaso define a vida das pessoas: “Não me considero o melhor. Acho até que devam
existir pilotos mais competentes do que eu, só que não tiveram a oportunidade
de expor essa habilidade”, foram suas palavras após conquistar o quarto título
mundial de pilotos.
— Bill Gates/Microsoft:
a quase totalidade dos usuários de computador no mundo considera Bill Gates o
criador do DOS e MS-DOS. Não é verdade. Em 1980 a IBM decidiu entrar no mercado
de computadores pessoais e enviou dois altos funcionários procurarem Gary
Kildall, inventor do sistema CP/M, muito usado na época. Não foram recebidos
nas diversas tentativas que fizeram, para sorte de Bill Gates. Desistiram e
procuraram Bill que, embora não tivesse um produto para atender a IBM, conhecia
alguém que havia desenvolvido um clone do programa de Gary, Tim Patterson. Bill
ofereceu a Tim US$ 50,000 e comprou os direitos autorais do que se tornaria o
MS-DOS, precursor do sistema operacional Windows, que tornou a Microsoft a
empresa de mais rápido crescimento em toda a história da economia mundial, até
hoje.
— Multi-User
Specialty Integrated Circuits: em 1992 uma pequena empresa filipina comprou um
endereço na internet. Como o nome era muito grande, usou as iniciais e
registrou o domínio music.com. Algum tempo depois a internet explode e a
empresa abandona os chips que fabricava e muda de ramo. Tornou-se um
concorridíssimo portal musical. “Pode nos chamar de sortudos ou espertos, mas
de um jeito ou de outro esse nome já nos trouxe coisas maravilhosas”, diz o
presidente da companhia, Philippe Bellosguardo.
— Rali Paris-Dacar:
em artigo relatando sua participação no rali mais famoso do mundo em 2001, o
jornalista Cacá Clauset da revista Quatro Rodas, ganhador nessa edição do
troféu TSO (Troféu Thierry Sabine), dado à equipe pelo esforço para cruzar a
linha de chegada, enfatiza que parte do prêmio entra na conta do fator VPL
(virado pra lua): “Em catorze anos competindo em ralis no Brasil e no exterior,
nunca vi o destino me ajudar tanto. No rali, o competidor precisa de muito
esforço e dedicação. Mas o destino tem seu peso. Até para ganhar a prova”.
Uma das minhas preferidas é essa, que
transcrevo da revista Seleções de nov/79: “Richard Bach, escritor e piloto,
exibia-se em 1966 no meio-oeste americano com um bi-plano incomum, um Detroit-Parks
P-2A Speedster de 1929, um dos únicos oito construídos. Na cidade de Palmyra,
no Wisconsin, ele emprestou o avião a um amigo que, na aterragem, bateu com o
aparelho. Relembra Bach em seu livro “Nothing by Chance” (Não por Acaso) que os
dois conseguiram dar jeito em tudo, menos no problema com uma longarina e
parecia não haver esperanças pela raridade da peça requerida. Foi aí que
apareceu um homenzinho e perguntou se podia ajudar. De brincadeira Bach disse:
“Mas claro! Você não tem aí uma longarina asa-a-asa para um Detroit-Parks
Speedster 1929, modelo P-2A?”. O sujeito entrou no hangar e em seguida voltou
com a peça pedida! “As chances de a gente ter quebrado o bi-plano numa
cidadezinha onde morava um homem que tinha a peça, velha de 40 anos, necessária
para o conserto; o acaso de ele estar ali quando a coisa aconteceu; a
casualidade de termos empurrado o avião exatinho para junto de seu hangar, a
três metros da peça que queríamos”, concluiu Bach, “tudo isso eram
probabilidades tão contra nós que pensar em coincidência não parece lá muito
inteligente”.
Poderia
mencionar mais de uma centena de casos. Os jornais, por exemplo, estão
recheados deles todos os dias. Certamente muitos são implícitos, mas se você
procurar nas entrelinhas das reportagens vai achar a presença sempre constante
da sorte, ou da falta dela.
No âmbito pessoal, cada um de nós faz
alguma coisa melhor que a maioria das pessoas ou foi aquinhoado com um dom
especial que nos diferencia. O segredo do sucesso pessoal está em descobrir e
desenvolver essa habilidade nata. Tenho comigo que talvez eu pudesse ter sido
um grande — tá bom, tá bom, mil perdões — um bom piloto, só que o mais próximo
que cheguei de corridas foi na arquibancada de autódromo. Nunca me dei chance
de chegar próximo, ao menos, de equipes de competição para travar conhecimentos
e hoje já é muito tarde. Aí está a essência do segredo: o tempo. Quanto antes
você se encontrar, mais cedo vai se preparar, e maiores serão as possibilidades
de sucesso.
E
nos negócios, que lição podemos tirar disso? Vamos cruzar os braços e aguardar
que a sorte mude? Certamente não é a melhor idéia. Se você fizer uma análise
mais acurada dos exemplos citados verificará que estar no lugar certo, e no
momento certo, é fundamental, mas vem sempre acompanhado do estar preparado.
Por isso, cerque-se de todo o preparo que julgar necessário, e mais um pouco,
quando decidir empreender algo e torça para que a sorte lhe bafeje. Tenha a
certeza que cedo ou tarde isso acontece. Só não perca a oportunidade e... boa
sorte!