quinta-feira, 31 de outubro de 2013

+Os maiores erros que cometi em meu negócio

CAPÍTULO 5

OS MAIORES ERROS QUE COMETI EM MEU NEGÓCIO


Logo que comecei a trabalhar surgiu uma vontade, que não parava de crescer, de ter meu próprio negócio. Carreira profissional em ascendência e capital sendo amealhado atrasou o sonho. Finalmente, perto dos 37, consegui o intento. Acertos e erros foram cometidos. Dinheiro foi ganho e dinheiro foi perdido. Grandes lições foram conquistadas.

As informações a seguir podem ser importantes para você que está procurando nas alternativas de negócio próprio ou na compra de uma franquia sua independência financeira. Afinal, as pessoas inteligentes aprendem com os próprios erros. Pessoas mais inteligentes aprendem com os erros dos outros. Galileu disse: "Você não consegue ensinar nada a ninguém; você só consegue ajudar alguém a encontrar o ensinamento dentro de si".

Desde o início alicercei o empreendimento na Limpeza, no Atendimento e na Qualidade. Julgo estas características fundamentais para obter sucesso na área de alimentação. Entretanto, com o passar dos anos cheguei à conclusão que somente estes cuidados não bastavam.

É certo afirmar que a maioria das empresas possui instalações asseadas, procuram ter o melhor atendimento e fazer o melhor produto. Feita essa constatação, podemos concluir que deve haver algo que as diferencie, senão, como explicar o sucesso de muitas e o fracasso de outras. Isso fica ainda mais claro quando as empresas comercializam os mesmos produtos, como lojas de departamentos, por exemplo.

O que efetivamente responde aos seus anseios de sucesso empresarial é a criação ou incorporação de um sistema de negócio. Um ótimo sistema de negócio é abrangente e dá fundamental valor à percepção que o cliente tem e leva dos produtos e dos serviços prestados. Prioriza a satisfação do consumidor em tudo que de alguma maneira o envolva dentro da empresa, direta ou indiretamente. 

Fazendo uma comparação com o conceito da origem das espécies, de Darwin, pode-se afirmar que um sistema de negócio é algo que evolui com o tempo. As empresas ao longo da história contemporânea sofreram, e sofrem, mudanças em suas identidades genéticas que são representadas, basicamente, pelo sistema de negócio de cada uma delas. Da mesma forma que as mutações genéticas nos seres vivos representam uma evolução, nas empresas as mudanças em seu sistema de negócio significam a sobrevivência num mercado dia a dia mais competitivo. Como na natureza, sobrevive o mais adaptado e não o mais forte.

É notório que diversas corporações, grandes no passado, hoje não mais existem porque faltou a elas o condicionamento inerente às constantes mudanças nos mercados locais e externos. Muitas delas fecharam ou se encontram com problemas por causa da globalização, por exemplo. Se ela, a globalização, é boa ou ruim, é irrelevante. A lição que fica é que devem ser sempre levadas em conta as mudanças no cenário do mundo empresarial, de forma a possibilitar as necessárias correções do sistema de negócio para a nova situação.

A essência da sobrevivência empresarial é um bom e dinâmico sistema de negócio e pela falta dele um número muito grande de empresas não passa do primeiro ano de vida. Outras, aos trancos e barrancos, mal conseguem chegar ao terceiro e somente algumas, faceiramente, comemoram o quinto aniversário, o décimo, e assim por diante.

Enfatizo no relato a seguir meus principais erros e quase nada falo dos inúmeros acertos, pequenos ou grandes, praticados nesses anos. Considere, ao final, que foram eles, os acertos, ou melhor, o sistema de negócio implantado que permitiu sua sobrevivência e por isso trato dele em praticamente todos os outros capítulos deste livro.

1988
Após ler um livro sobre o McDonald’s em minhas férias na praia, achei que já era hora de ter meu próprio negócio. Depois, peguei uma filmadora e tomei algumas imagens de Curitiba. Juntei ao filme alguns folhetos em inglês, feitos pela própria prefeitura para atrair turistas e negócios para a cidade, e mandei tudo para a sede mundial do franqueador em Chicago, USA, solicitando informações sobre a franquia. Depois de mandar meu cadastro e tido pelo menos quatro reuniões com o presidente da rede no Brasil fui preterido por não ter os US$ 460,000 necessários. Decidi empreender por conta própria.

COMENTÁRIO: meu histórico profissional até aquele momento nunca havia contemplado experiência na área de alimentos. A opção deu-se por oportunidade, dinamismo da operação e aparente risco menor, pois afinal, todos precisam comer.

NOTA: algumas pessoas diziam que eu iria cometer uma loucura e perguntavam: por que, logo agora que o McDonald’s estava vindo para a cidade, eu pensava em abrir uma lanchonete? Eu pensava o contrário: era uma oportunidade porque a rede americana, com suas propagandas nos meios de comunicação, poderia alavancar o consumo de hambúrgueres e sanduíches — que de fato aconteceu — e minha loja seria uma interessante opção para o público consumidor.

1989
Com um sócio, sem o qual não teria sido possível a concretização do desejado negócio próprio, inauguramos, em 11 de dezembro, depois de seis meses de reforma e adaptação do imóvel para um restaurante fast-food, nossa primeira loja.

COMENTÁRIO: a procura por um bom ponto comercial demorou três meses e não foi fácil. Finalmente, num pequeno anúncio de jornal achamos um que com frequência passávamos na frente e era de esquina. Não custa nada bater à porta dos locais que julgar adequados e perguntar se não estariam dispostos a negociar o ponto. Teríamos ganhado tempo.

         Alguns cuidados foram tomados na constituição do negócio, tais como a definição de um nome que chamasse a atenção do público e se relacionasse com aos produtos que seriam vendidos. Nossa primeira funcionária foi uma nutricionista e com ela direcionamos os produtos para a “geração saúde” através do balanceamento calórico e nutricional de sanduíches abertos, fechados e pratos executivos (esses introduzidos no cardápio ao final dos anos 90) de qualidade intrínseca superior às demais redes de fast-food que, seguidamente, sofrem ataques na mídia, quer nacional, quer internacional, pelo alto teor de gordura em seus produtos.

O hambúrguer originou-se na culinária medieval entre os Tártaros que, numa prática popular, esmigalhavam a carne para poderem comer. No início do século XIV os Tártaros Russos introduziram o bife tártaro na Alemanha. Lá o povo passou a misturar temperos regionais e o prato tornou-se comum na cidade de Hamburgo. Aproximadamente em 1880 foi levado por imigrantes aos EUA onde foi primeiramente chamado hamburg steak e depois, simplesmente hamburg.

Nos dias de hoje o hambúrguer continua basicamente o mesmo, sendo feito em grandes frigoríficos com carne triturada de baixo valor comercial e um teor de gordura agregado de 20%, em média. Por isso os hambúrgueres industrializados, quando provados de forma isolada são insossos e gordurosos, não resistindo à degustação de pessoas esclarecidas e apreciadoras dos prazeres da mesa.

Nosso hambúrguer resgatou do século XIV apenas a idéia de adicionar temperos. Todo o resto é diferente. Usamos somente carnes nobres (bovina de primeira ou peito de frango) de onde é retirada toda a gordura visível. Após dupla moagem misturamos molho inglês, molho de pimenta, ovos, especiarias, etc.

Com produtos rotulados como good-food, fato estratégico e que proporcionou à marca um posicionamento diferenciado no mercado extremamente competitivo do fast-food começamos nossa caminhada.

 1990
Eram apenas oito tipos de sanduíches. O faturamento nos primeiros meses do ano não cobriu os custos da operação. Pequenos aportes de capital foram necessários. Verificamos que nosso mix de produtos era muito pequeno. Introduzimos no cardápio os sanduíches abertos.

COMENTÁRIO: verificamos que diversas pessoas pediam talheres para comer os sanduíches. Desenvolvemos o sanduíche aberto, servido numa travessa com batatas fritas, e o sucesso foi imediato.

DICA: prestar atenção aos detalhes faz diferença. Faça disso um hábito. Embora óbvio, não custa lembrar que são as pequenas coisas que fazem o todo, ou seja: o que é visto, o que é lembrado, o que é importante. No exemplo acima, a observação de um detalhe fez com que a loja oferecesse, ao invés do cliente ter que solicitar, o conforto, a praticidade e a limpeza proporcionada pelo uso de talheres. Cliente satisfeito é igual a maior faturamento.

1991
Até então não havia retirada de pró-labore. Em meados do ano fomos convidados por um cliente, que era presidente da Associação dos Lojistas de um shopping localizado no centro da cidade, para abrir uma loja no local. Única exigência: contratação da mesma arquiteta para fazer o projeto porque pretendiam que fossemos a ponta de lança de uma reformulação que visava a mudança de perfil do público visitante/consumidor do shopping. Ofereceram aluguel baixo, com carência até a abertura da loja, e não cobraram o ponto comercial.

A nova loja foi inaugurada em dezembro e desta vez não precisamos de amigos e parentes "cobaias" para desenvolver produtos e operação de loja. Já tínhamos uma e bastou treinar nela os novos funcionários. No primeiro dia foram vendidos perto de 10 sanduíches. O sinal amarelo começou a piscar.

COMENTÁRIO: nossa primeira loja ainda não estava pronta e pessoas entravam para saber quando iríamos abrir. No primeiro dia vendemos quase 100 sanduíches. Esta segunda loja estava na área de alimentação (na verdade um corredor de alimentação) com diversos restaurantes tipo "bandejão". Havia público, mas não com o perfil para o nosso produto. PRIMEIRO GRANDE ERRO!

DICA: ponto ruim, de graça é caro. A conotação ruim, neste caso particular, refere-se ao contexto tipo de produto/público consumidor. Para melhor exemplificar: é jogar dinheiro fora colocar uma joalheria fina no Terminal Tietê, em São Paulo. Embora lá circulem dezenas de milhares de pessoas todos os dias, o tipo de produto denota pesquisa, escolha demorada e preço alto. Jóia não é produto com venda por impulso. No futuro, entretanto, aquele ponto no shopping mostrou-se muito bom, como veremos.

1992
Ao final de fevereiro, depois de argumentar e conseguir aprovação junto à direção do shopping, fechamos a loja. Sérios problemas à vista. Além das despesas normais de encerramento de atividades, como rescisões trabalhistas, havia a necessidade de mais capital para reforma e transformação da loja num restaurante que atendesse o público local. Para tal propósito já havíamos escolhido o nome e logomarca.

Felizmente a loja 1 estava indo bem e em março/abril tivemos a sorte de receber convite para participar do processo de escolha para operação de uma lanchonete interna numa grande indústria multinacional. Fomos escolhidos pela qualidade do nosso produto. Embora pequeno, o local estava pronto, com equipamentos básicos instalados e o início pôde ser imediato. Eram quase mil funcionários e não tínhamos custos com pagamentos de aluguel, luz, água e telefone. Bom faturamento e custo fixo muito baixo. Às quartas-feiras, dia de peixe ensopado no restaurante da fábrica, era bonito ver a fila no caixa de nossa "lojinha".

NOTA: em comum acordo e de maneira amigável, foi desfeita a sociedade em junho. Fiquei com a marca e a loja piloto. Meu ex-sócio ficou com a lanchonete na indústria e com a loja fechada do shopping. Com ajuda direta da esposa, principalmente, e dos filhos ainda pequenos à época, a loja foi reaberta como um restaurante. Muito trabalho e esforço conjunto, atenção aos detalhes, ótimo atendimento e competência, proporcionam à família ótimos resultados financeiros naquele shopping.

1993 – 1994
Estes anos foram tranquilos, embora houvesse dificuldade na renovação do alvará porque as mesas externas, posicionadas no recuo predial, eram protegidas por toldo e janelas de vidro. Para resolver o impasse, retirei todas as janelas e o ambiente ficou aberto. Tinha como preocupação o fato do clima em Curitiba variar muito num mesmo dia, além de ser a capital mais fria do país, pois a loja perderia área protegida de venda. Surpreendentemente aconteceu o contrário. Desta modificação em diante as vendas começaram a aumentar mês a mês, continuamente.

No segundo trimestre de 94 foi contratada uma consultoria de franchising para formatar o negócio para o sistema de franquias.

1995
Em junho participei da maior feira de franquias do Brasil, ABF Franchising Show, com estande próprio em São Paulo. Foi um investimento relativamente alto e que não resultou em nenhuma venda de franquia. Aqui houve um erro de avaliação de oportunidade. O investimento é interessante para projetar uma marca regional com algumas lojas próprias ou franquias em nível nacional e não era o nosso caso, pois tínhamos somente a loja piloto.

De volta às bases, uma vez mais fui procurado e convidado para abrir uma loja num pequeno shopping, com somente 14 lojas, localizado em bairro nobre de Curitiba. Novamente não cobraram luvas. Entretanto, o valor do aluguel e condomínio, somados, chegava ao dobro da loja de rua. Em novembro inaugurei a segunda loja. Cometi meu SEGUNDO GRANDE ERRO em não avaliar a localização criteriosamente!

1996
As vendas na nova loja não estavam boas. O shopping era pequeno, pouco visível e por estar localizado em meio de quadra não chamava a atenção das pessoas. A Associação dos Lojistas fez várias reuniões com o dono do shopping visando buscar soluções que atraíssem mais público. Era consenso que precisaríamos "fazer o ponto" e isso leva tempo. Era fundamental uma redução de custos fixos para essa empreitada, mas o dono sempre se mostrou avesso em reduzir o aluguel. Assim sendo, treze lojistas deixaram o local. Fechei a loja no final do ano e concomitantemente comprei um outro ponto, com aproximadamente 35m² em um novo shopping que trazia um conceito inédito no país, chamado shopping de lazer. Seria o primeiro do Brasil.

COMENTÁRIO: considero a montagem de uma loja naquele pequeno shopping meu segundo grande erro. Mas talvez não. Nunca saberei. A região é ótima, possui grande densidade populacional e tem a maior renda média por habitante da cidade. A loja tinha acesso direto para a rua e paulatinamente iríamos, todos os lojistas, fazer o ponto. O que foi decisivo para o insucesso do empreendimento como um todo foi a intransigência do incorporador. Essa situação, infelizmente, é comum. Muitos proprietários preferem o imóvel vazio e gerando despesa a baixar o aluguel. Isso é ilógico e prejudica todos os envolvidos.

1997
Tendo gasto todo o capital disponível no empreendimento anterior e ainda pagando as luvas do novo ponto comercial, não tinha mais dinheiro para esta nova loja. Assim optei por tomar um empréstimo junto ao BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul), pois a empresa era rentável e já tinha histórico contábil para tal pleito. A obtenção de empréstimo junto àquela instituição em particular é estressante, mas a taxa de juros menor justifica o esforço.

A tremenda burocracia envolvida tem um aspecto positivo que é o aval para a administração da empresa, visto ser feita uma minuciosa análise do negócio pelo SEBRAE, que emite um relatório, recomendando ou não o financiamento, para ser apresentado ao BRDE. Neste relatório foi dito sobre a lucratividade do negócio o seguinte: “No entanto, deve-se considerar que, para o momento de competitividade enfrentada, a lucratividade de 10,01% é muito boa, seja para qualquer ramo de negócio. Da mesma forma se apresenta a rentabilidade sobre o PL, o que garante ao empreendimento uma atratividade para potenciais investidores.”

Nessa loja fiz parceria com uma empresa e fomos pioneiros em oferecer acesso à internet em algumas mesas especialmente construídas, com computador e monitor dentro delas. Loja e shopping foram inaugurados em novembro. Naquela oportunidade achava que a escolha do local era correta porque grandes marcas lá estavam. Elas ou contratam consultorias especializadas ou possuem quadro profissional específico para seleção desse item muitíssimo importante, o ponto comercial. Infelizmente a sorte não estava presente e foi meu TERCEIRO GRANDE ERRO!

COMENTÁRIO: o investimento necessário numa loja de shopping é significativo porque os locais são entregues "no osso" e todo acabamento, hidráulica e elétrica são feitos pelo lojista. Nos grandes centros comerciais, com mais de uma centena de lojas, o capital requerido é ainda maior por causa das exigências construtivas, tais como ar condicionado central e sistema de exaustão com filtros eletrostáticos.

NOTA: o lançamento do primeiro shopping de lazer do Brasil foi uma peça de marketing eficaz e os incorporadores fizeram muitas exigências. O McDonald's, que a exemplo das lojas ancoras tem tratamento diferenciado (leia custo com condomínio de somente 1% do faturamento) foi tratado à época como lojista normal, com valor de condomínio estipulado por m², igual aos demais.
O maior fabricante de refrigerantes do país tentou e quase conseguiu ter exclusividade total no shopping. Assim que souberam que lá estaríamos, ofereceram um contrato de exclusividade. Aceitei porque significou entrada de dinheiro em espécie. Era grande a euforia que tomou conta da cidade com o empreendimento. Havia consenso que todos que lá estivessem ganhariam muito dinheiro. Ledo engano. Em 2003 o shopping passou às mãos do quarto incorporador para tentar recuperá-lo. 

1998
As vendas da loja 1 continuavam muito boas. Entretanto, as vendas da loja do novo shopping vinham num decrescente preocupante e desde o início do ano já era necessário injetar dinheiro todos os meses para cobrir os custos da operação. O faturamento dessa loja em maio pagava apenas o aluguel, nada mais! Também em maio acabaria a carência do empréstimo e havia pela frente 30 parcelas mensais junto ao BRDE.

Os lojistas faziam reuniões frequentes que incluíam vez ou outra a administração do shopping. Os maiores problemas eram a cobrança de ingresso para entrar no shopping e o público frequentador que comparecia em grande número nos finais de semana para escutar música e beber cerveja. Só para comparação, a loja 1 vendia 90 litros de chope numa semana, no verão. Nesta, nas sextas e sábados, eram vendidos perto de 400 litros! Sanduíche que é bom, quase nada. Várias lojas fecharam; franquias inclusive. Não sou o tipo de pessoa que fica agonizando para tomar decisões e fui um dos primeiros a desistir. Em junho, optei por uma saída negociada abrindo mão do ressarcimento das luvas e o shopping da multa contratual.

Para meu lamento o prejuízo foi total, igual ao valor do investimento. Li uma frase de um bem sucedido empresário, Gordon Hoffstein, que atenua, pouco é verdade, meu sentimento de perda. Diz ele que aprendeu com seus fracassos tanto ou mais que cursando um MBA e se consolou dos fracassos encarando o dinheiro perdido como uma anuidade de um curso universitário.

COMENTÁRIO: O Plano de Negócios deste empreendimento indicava que ele se financiaria, ou seja, o lucro gerado deveria pagar o empréstimo tomado. Finda a dívida, o lucro daí em diante é caixa do empreendedor. Esta receita de criar ativos com dinheiro de terceiros funciona e é a mola propulsora do jogo chamado capitalismo.

DICA: receita velha, mas que funciona: faça o dinheiro trabalhar para você. Não assuma passivos. Ou melhor, só assuma passivos que possam se transformar em ativos que gerem dinheiro.

1999
Neste ano fiz a primeira renegociação da dívida junto ao BRDE. O prazo foi alongado e o valor das prestações reduzido. Nessa altura, as vendas da loja 1 tinham caído quase 10%. Talvez reflexo do mercado. Talvez reflexo do fechamento de lojas próprias. Talvez ambos.

Em maio foi assinado o primeiro contrato de franquia da marca. Esta loja franqueada foi aberta num shopping de bairro em Curitiba.

REFLEXÃO: quando escrevo este livro penso no porque das coisas terem “fugido ao controle” do final deste ano em diante e tenho como certa minha exclusiva responsabilidade. Hoje refletindo à luz dos fatos posso verificar que abandonei, literalmente, a loja piloto à própria sorte. Larguei sua gestão a pessoas que estavam à mão, não preparadas e que não possuíam os requisitos necessários. O motivo da pressa foi a formação, em meu íntimo, de uma aversão psicológica ao negócio pelo passado lembrado. Confesso que foi doloroso chegar a essa conclusão.

2000
Em abril, depois de alguns meses de negociação e preparo e, após consultas a advogados trabalhistas, transformei a loja piloto em uma franquia, a segunda. A loja vendida era rentável e a pessoa jurídica (razão social) sem dívidas, com todas as obrigações tributárias, trabalhistas, comerciais, etc rigorosamente em dia. O volume de vendas estava, com folga, acima do ponto de equilíbrio. Foi acordado que a dívida junto ao BRDE, ou seja, as 32 parcelas faltantes daquele empréstimo seriam pagas por mim.

O motivo da venda, que veio a configurar-se seguramente em meu MAIOR ERRO, já foi explicado na reflexão acima. Decidi ficar “semi-aposentado” e avaliar alternativas de negócios. Em julho foi vendida a terceira franquia, uma loja de rua, com troca de bandeira. Isso quer dizer que o novo franqueado já possuía uma franquia na área de alimentação e optou por trocar de marca em seu ponto comercial. A loja foi inaugurada em outubro.

2001
O último franqueado, no início do ano, notificou que desejava sair do ramo de alimentação. Os motivos informados foram a compra do imóvel em frente pelo McDonald's e um convite já antigo para trabalhar na fazenda de seu sogro. Argumentei que poderíamos ganhar novos clientes com a proximidade do grande concorrente, pois nossos produtos, embora similares, poderiam ser preferidos por serem mais saudáveis. Essa é uma tendência irreversível que já é buscada pelas grandes redes. Só largamos na frente. Ao longo dos anos, muitos e muitos clientes afirmaram isso. Compreensivelmente, falou mais forte o fator risco zero e não impus dificuldade para rescisão do contrato de franquia. Poderia ter comprado a loja, mas nem cogitei esta opção.

De fato, tinha iniciado e/ou avaliado novos negócios e retomado com vigor o gosto pela leitura de livros e publicações do ramo de gestão empresarial. Também re-avaliei minha franquia. Pensei em um novo tipo de loja, que chamei de modular, cujo Plano de Negócios foi balizado por reduções significativas de riscos e custos fixos. Esta loja modular foi idealizada para utilizar espaços internos ou externos em outros empreendimentos comerciais, centros educacionais e empresariais, etc, agregando valor um ao outro. Pode, entretanto, também ser uma loja isolada. Repensei e refiz todo o sistema de franchising de minha empresa. Na mesma época em que terminava, vieram à tona os sérios problemas da loja piloto que havia sido transformada em franquia.

Desde o início mantinha encontros e/ou breves reuniões quinzenais, e às vezes semanais, com a sócia-gerente para orientações. Perguntava se havia algum problema ou dificuldade e a resposta era sempre negativa. Então, quando corria para o fim o mês de setembro, numa reunião com todas as sócias, a mais vivida resolveu abrir o jogo: estavam sem receber pró-labore desde o início do ano, contas estavam em atraso e havia risco iminente de continuidade da franquia. Abalado perguntei por que deixaram a situação chegar àquele ponto sem pedir ajuda e a resposta foi que elas achavam que resolveriam os problemas sozinhas.

Por oportuno cabe aqui comentar sobre o aparente descontrole do franqueador sobre a unidade franqueada que alguns podem inferir. Certa vez uma pessoa me mandou um e-mail onde dizia, textualmente, referindo-se à minha idéia de transformar a loja piloto em franquia: “não me parece que os interesses franqueador/franqueado sejam convergentes, afinal o franqueador visa interesses maiores, da marca, e suas ações são estratégicas, enquanto o franqueado trabalha pontualmente objetivando o sucesso do seu PDV — embora pareçam a mesma coisa, não são de fato; depois, porque sem qualquer domínio da loja o franqueador fica à mercê do franqueado.

Parte dessa opinião é correta. Efetivamente grandes redes mantêm um controle total e às vezes sufocante sobre seu franqueado, muito embora não possuam o domínio, ou posse, da franquia. E há razão para isso. Se ocorresse como opinado, domínio da loja, os franqueadores afrontariam a Lei Nº 8.955 que regula o sistema de franchising e seriam arrolados em todas e quaisquer pendências financeiras, fiscais, trabalhistas, criminais, etc da franquia.

Por outro lado há o notório caso do McDonald’s que possui uma visão estratégica de negócio divergente de seus franqueados: o idealizador do sistema, Ray Kroc, disse que seu negócio era imobiliário e que não atuava no ramo de hambúrgueres. Isso era negócio para os franqueados. Essa visão de negócio levou o McDonald’s a ser a empresa que detém maior quantidade de imóveis em todo o mundo, sendo a renda dos aluguéis das lojas sua principal fonte de recursos. Todavia, essa política levou a rede a ter sérios problemas com muitos de seus franqueados no Brasil, que estão discutindo na justiça os contratos de franquia, no que tange às condições de locação das lojas impostas pelo franqueador.

Ao longo deste livro tento demonstrar que controle é imprescindível e deve ser feito pelo dono ou franqueado junto ao seu negócio ou franquia. A observância da missão, métodos, regras e diretrizes da empresa franqueadora são importantes para o sucesso da rede como um todo e precisam ser seguidos pelos franqueados.

Constatada a séria falha de gestão administrativa/financeira, foi acordada a venda para outra pessoa que tivesse preparo e dispusesse de capital para injetar no negócio. Sugeri um corretor de negócios para intermediar o processo. Esta pessoa vendo o potencial da franquia quis entrar na sociedade, propondo-se a gerir o negócio. Mas só fez piorar as coisas, pois além de péssimo administrador, apresentou nuanças de má fé. Felizmente foi por muito pouco tempo. Ao final de novembro conseguimos que este elemento saísse. Houve ainda uma senhora com perfil ideal que quase comprou a franquia, mas ficou receosa com a situação financeira encontrada. Não restou alternativa que não fosse minha volta.

COMENTÁRIO: embora as franqueadas fossem pessoas boas trabalhadoras, esse fato não evitou as dificuldades financeiras que se originaram na falta de postura administrativa, resultando em queda de vendas e descontrole total dos custos variáveis. Um diagnóstico preciso da origem dos problemas revelou o abandono total, pelas franqueadas, dos métodos de controle e diretrizes do sistema de negócio do franqueador.

Para explicar, disseram que sempre havia uma das sócias na loja e, sendo assim, tais controles eram desnecessários. Como agravante, assim que assumiram, passaram a consumir produtos da empresa de forma desenfreada sem a contrapartida do pagamento devido. Aliou-se ao problema a conseqüente contaminação que tal prática causou aos funcionários da loja. Ou seja, por que montar os sanduíches com as quantidades especificadas quer para clientes, quer para seus lanches, e registrar todas as vendas, se as donas, que deveriam ser as maiores interessadas, agiam de forma totalmente contrária e despreocupada neste aspecto?

Para ilustrar o absurdo da situação: foram vendidos em outubro de 2001 pouco mais de 4500 sanduíches. Isso significaria um consumo mensal de 139 kg de tomate. Entretanto, havia uma programação semanal de 80 kg com o fornecedor. Foram comprados 320 kg de tomate naquele mês, que representaram 130% de custo a mais somente neste insumo!

NOTA: o maior e mais importante jornal de Curitiba publicou matéria de meia página sobre a venda para as ex-funcionárias sem citar, em momento algum, a informação da loja ter ser transformado numa franquia da marca. O foco da reportagem (mulheres compram empresa do patrão) deu a entender que a marca havia sido vendida junto com o estabelecimento e este fato acelerou a perda de faturamento das franqueadas. Infelizmente não consegui correção das informações da matéria, embora já no dia seguinte à publicação tenha enviado carta ao jornal em atenção da jornalista responsável.

2002
No dia 2 de janeiro eu estava a postos na loja como franqueado e franqueador ao mesmo tempo. Coloquei um banner na fachada da loja com o título SOB VELHA DIREÇÃO. Já no dia 5 fiz um aporte de dinheiro para solucionar os imediatos problemas causados pela falta de capital de giro. Uma vez mais precisei bater às portas do BRDE para outra renegociação. Ao final do mês, todas as pendências financeiras estavam resolvidas. Em fevereiro já puderam os sócios receber parte do pró-labore. Em março, navegávamos em águas mais tranquilas.

Foi necessário contratar uma advogada para fazer o distrato da venda da empresa e o acordo final contemplou o franqueador com 63% das cotas, ficando os outros 37% com as cinco ex-compradoras. Em maio consegui nova renegociação com o BRDE. Teríamos pela frente, agora, 42 parcelas. O resto do ano transcorreu normalmente, com o astral das pessoas muitíssimo melhor e com uma recuperação nas vendas que possibilitou margem sobre o ponto de equilíbrio.

NOTA: Hoje, mais que nunca, o atendimento aos clientes, outro rótulo para o ato de vender, deve ser perfeito e para isso é fundamental o treinamento continuado. No nosso sistema de negócio, o franqueado é o responsável por esse treinamento, que deve ser feito regularmente para garantir a padronização nos serviços e nos produtos. Entretanto, tal procedimento foi relaxado pelas franqueadas. Voltamos a exercitar os empregados todas as sextas-feiras, por 30 minutos, e o serviço voltou a ser muito elogiado pelos clientes.

Acredite, treinamento faz diferença e sempre apresenta resultados palpáveis.

COMENTÁRIO: dizem que a primeira profissão do mundo foi a prostituição, mas na realidade foi a segunda. Primeiro houve uma negociação. Desde então, o ato da venda rege os destinos do mundo. Qualquer pessoa, atividade, negócio, etc tem clientes. É claro que os clientes podem possuir diversos rótulos, tais como eleitores, associados, namorada ou namorado, empresa e por aí afora.

Quando, por exemplo, uma pessoa vai fazer uma entrevista concorrendo a uma determinada vaga, prepara-se, veste-se bem e procura apresentar o melhor de si, ou seja, "vender-se" da melhor forma à empresa para conseguir seu intento, o emprego. Quando alguém compra um produto, serviço e/ou trabalho é porque foi convencido. É simples assim.

É pertinente você saber que perto de 70% das empresas em atividade no mundo tem como fundador ou fundadora uma pessoa oriunda da área comercial. Meu primeiro registro na carteira de trabalho depois de formado foi como “engenheiro de vendas”. Lembro que, à época, fiquei indignado. Afinal, estudei tanto para ser um “simples vendedor”? Para complicar mais, achava que não tinha aptidão para a profissão.

Circunstancialmente, após ser co-autor de um trabalho publicado em uma revista especializada de redução de custos pelo uso de um novo processo de soldagem, fui promovido a supervisor de vendas e transferido de cidade. Precisava fazer algo a respeito. Entrei numa livraria e comprei alguns livros que ensinavam a arte da venda. Acho que não sou um vendedor nato, mas aprendi muita coisa dessa importante e por vezes maltratada e incompreendida profissão — culpa de maus vendedores. Ficou muito mais fácil relacionar-me com outras pessoas. Só isso já vale muito.

Então, se você não vem da área de vendas, sugiro que procure conhecê-la, nem que seja através de livros, porque os frutos serão muito importantes para sua empreitada no ramo dos negócios. Afinal, além de negociar, você terá de vender seu serviço, seu produto, sua idéia, etc. Se não vender... Exercite sempre que possível falar em público para melhorar sua comunicação ou faça um curso de oratória para obter técnicas de relacionamento com outras pessoas.

Em tempo: os 30% restantes ou idealizaram um produto impar sem concorrência que se vendia por si só ou tiveram que contratar pessoas para vender seus produtos.

Ao final de novembro fiz uma reunião onde apresentei os resultados até então e a meta para 2003, incluindo uma pequena reforma na loja. Embora tardiamente, ao longo do ano procurei ensinar o mínimo necessário sobre a importância dos custos, ponto de equilíbrio, formação de preços, balancetes, controles de loja, etc e sugeri, mais de uma vez, a leitura de publicações do SEBRAE. Fiz até mesmo uma compilação de artigos de interesse para o negócio, publicados em revistas e jornais, na forma de uma apostila. Enfatizei a importância do treinamento, deixando uma pergunta no ar, naquela ocasião: O desenvolvimento pessoal e profissional depende do que cada uma faz por si mesma e para si mesma. Que treinamento você se deu em 2002?

2003
Vendas estáveis no início do ano e a partir do fim do segundo trimestre houve queda para valores muito próximos do ponto de equilíbrio. Muito contribuiu para isso a recessão econômica no país e o aumento dos custos dos insumos, sem que pudéssemos repassar para os preços de venda. Na primeira semana de julho fiz nova reunião com as sócias expondo a situação.

Face à impossibilidade de injeção de capital dos sócios para uma necessária reforma da loja e capital de giro decidimos então, em comum acordo, vender o negócio. Interessados houve, mas uma das sócias, exatamente aquela que tinha informado a situação crítica no passado, manifestou o desejo de comprar a franquia para tocar com a família. Pesou na sua decisão os fatos de meu ex-sócio ter tido sucesso empresarial trabalhando em família e de ela estar na empresa havia oito anos. Pesou na minha decisão de aceitá-la como franqueada o fato de que, junto com seu marido (ambos assalariados), terem construído um pequeno patrimônio imobiliário que lhes proporciona renda extra com alugueis. Isso demonstra sapiência e empreendedorismo. Evidentemente haverá muito trabalho pela frente e dezembro foi o último mês em que a empresa teve vários donos.

COMENTÁRIO: conheci uma pessoa que conseguiu transformar ex-empregados em empresários. Por 15 anos esse professor foi dos melhores franqueados de uma rede de ensino de inglês e possuía duas escolas em Curitiba. Na busca da aposentadoria, em 2003, vendeu uma delas para um grupo de funcionários. Em 2004 iniciou a preparação da transferência da segunda escola para outro grupo de ex-colaboradores. Para sucesso de seu intento, além de contar com a necessária aquiescência do franqueador, treinou os “herdeiros” com competência, tendo a sorte de possuir à mão pessoas mais qualificadas para serem os novos franqueados daquela rede. 

Finalizo este capítulo fazendo uma divagação sobre sócios. Como afirmei no início deste histórico, a existência de um sócio foi fundamental e decisiva para que tivesse meu próprio negócio. Antes, tive um sócio em um projeto para produção hidropônica de verduras. Tive também uma loja de vinhos finos em sociedade com outra pessoa e até o final de 2003 contava com cinco sócias na minha loja piloto. É certo que aprendi algumas coisas sobre relacionamentos societários:

Primeiro: seria muito difícil qualquer um de nós (eu e as pessoas com quem mantive sociedade) ter iniciado algo sem a ajuda de sócios, quer no aspecto financeiro, quer na idealização e construção do empreendimento. A última afirmação parece ter mais peso porque, psicologicamente, o ser humano fica mais confiante para desbravar novos caminhos tendo companhia.

Segundo: logo após a inauguração, o relacionamento é similar ao de um casal em lua de mel. Aparecem alguns defeitos, mas a compensação, digo, a novidade empresarial, é melhor.

Terceiro: todo novo empreendimento, geralmente, não apresenta resultados financeiros imediatos e as cobranças entre os sócios podem aumentar. É hora do bom senso prevalecer. Sem ele, a exemplo de um casamento e sem os prazeres deste, a convivência pode tornar-se impossível e o empreendimento morre ainda na infância.

Quarto: O ideal é que os sócios sejam competentes e tenham atributos/experiências profissionais complementares e não comuns. Dessa forma cada qual é responsável por atividades distintas na empresa. Certa vez li e guardei um texto que ilustra bem a falta disso.

Era uma vez uma empresa que tinha quatro sócios chamados: TODO MUNDO, ALGUÉM, QUALQUER UM e NINGUÉM.

Havia um importante trabalho a ser feito e TODO MUNDO estava certo de que ALGUÉM o faria.

QUALQUER UM poderia ter feito, mas NINGUÉM fez...

ALGUÉM ficou zangado por isso, pois era um trabalho de TODO MUNDO.

TODO MUNDO pensou que QUALQUER UM poderia fazê-lo, mas NINGÉM imaginou que TODO MUNDO não o faria.

O enredo termina com TODO MUNDO culpando ALGUÉM, quando realmente NINGUÉM poderia responsabilizar QUALQUER UM.






        
Em 2006 o imóvel onde havia instalado a primeira loja foi vendido. Assim, rescindi o último contrato de franquia, encerrando definitivamente minha odisséia no ramo da alimentação. Em tempo, o financiamento junto ao BRDE foi quitado.


2 comentários:

  1. João perdi seu contato, como faço pra falar com vc??
    Maria Alice Montanha

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    1. Olá Maria Alice!
      Por favor, escreva para engesand@gmail.com
      Grande abraço. João

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